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August 12, 2017 - CC50 do Pacífico ao Atlântico

August 12, 2017 -  ?> | No comments | Iron Butt, Viagem

CC50 do Pacífico ao AtlânticoComo foi dito no artigo anterior, a viagem para o Chile tinha a motivação de fazer na volta o CC50 que seria vir do Pacífico ao Atlântico em menos de 50 horas! O CC50 original foi idealizado para os motociclistas que não queriam a longa rota de Nova Iorque até São Francisco. Esta rota cruza os Estados Unidos na sua diagonal e o CC50 cruza de forma transversal, saindo da Flórida e indo até São Diego, na Califórnia, por exemplo. Logo, em várias partes do mundo foram criadas rotas que fazem costa a costa de algum país ou continente, como é o nosso caso aqui na América do Sul.

Aqui na América do Sul temos alguns desafios Coast to Coast: 50CC é cruzar 4 países e rodar até 1.700 milhas (2.736 km) em 50 horas; outro é CC30, cruzar 3 países e rodar 2.500 km em 30 horas. Enfim, temos várias possibilidades e rotas diferentes. O Balcewicz e eu escolhemos fazer Valparaiso, Chile até Chuí, Brasil, passando pelo Uruguai. Deu 2185 km em pouco menos de 39 horas, com uma parada para dormir na Argentina. Vamos ao relato.

Primeiro dia: Chile – Argentina

A ideia de sair cedo e só uma ideia! Fazer isto em mais de duas pessoas, significa algum atraso. No nosso caso, foi encontrar algum policial chileno disposto a assinar no formulário de testemunha. Tivemos que rodar a cidade até encontrar um, e só foi no Quartel de Valparaiso, pois os policias nas ruas não queriam de forma nenhuma assinar. Depois da coleta da assinatura fomos até o posto completar o tanque, pegar o tíquete de abastecimento e começar a jornada. Já era passado das 8:20 da manhã quando partimos.

CC50 Pacífico Atlântico

Tíquete do início do CC50, em
Valparaiso, Ch.

E sair de cidades também tem sua dificuldade, por sorte era sábado, então o movimento estava bem mais calmo. No planejamento que fiz, preocupei-me apenas com encontrar postos no limite da autonomia da moto. Como o colega também estava com outra Tiger Explorer, porém XC, não tínhamos muita diferença de autonomia.

E a primeira parada para abastecer foi em Los Andes, já na subida para os Caracoles. Aqui um problema, este posto só tem combustível, nada de comida para vender! E como saímos cedo dos hotéis, o café da manhã foi frugal.

Subimos bem os Caracoles e logo estávamos na Aduana do Chile, onde não é necessário parar, pois o controle integrado de fronteiras, para quem volta, é depois do túnel Cristo Redentor, e um pouco antes de chegar na Puente del Inca. Se soubéssemos disto, teríamos ganhado um pouco de tempo. Fica o registro para quem fizer esta passagem na próxima vez.

CC50 Pacífico Atlântico

Passo los Libertadores, Chile.

Chegando ao controle aduaneiro da Argentina encontramos uma fila enorme, para variar. Ficamos ali 43 minutos, sob o sol, até entramos na parte coberta. Por sorte, com as motos o trâmite é mais rápido e logo estávamos liberados para descer os Andes, em direção a Mendoza. O próximo abastecimento foi um pouco antes de Mendoza, em Lujan de Cuyo, agora com direito a comida e um pouco de descanso. 382 km rodados desde a saída de Valparaiso. A temperatura estava boa até chegar a região de Mendoza, dali para frente esquentou bocado.

CC50 Pacífico Atlântico

Aduana integrada, Chile e Argentina.

Ficamos parados um bom tempo neste posto e, este parece ser o problema das provas Iron Butt, demora-se demais nos postos, geralmente para comer algo muito simples e sem valor nutricional, mas pelo menos faz-se um descanso mínimo. Aqui foram 44 minutos para abastecer, ir ao banheiro e comer.

Saindo de Lujan de Cuyo passaríamos ao lado de Mendonza em direção a San Luis, outra parada já que o odômetro marcava 274 km. Aqui também eu deveria ter feito um desvio da cidade, mas não percebi a entrada para a Ruta RN-7 e seguimos direto para San Luis. Pelo menos havia mais opções de abastecimento. Tal lá, como aqui no Brasil, entrar em cidades significa trânsito complicado, lombadas e sinaleiros. E sinaleiros na Argentina parecem ser coisa de doido, pois não tem ninguém na rua e a temporização é muito alta. Aqui foram quase 40 minutos.

Pegamos algumas pancadas de chuva. No horizonte grande nuvens de chuva derramavam água por onde passavam, mas tivemos sorte, pois pegamos quase nada. Colocávamos as roupas de chuva por precaução, não era necessário. Esta parte da Argentina é plana e cheia de retas intermináveis. Para variar, estradas desertas!

Próxima tocada foi até Rio Cuarto, mais 211 km onde chegaríamos já noite. Aqui ficamos menos de 20 minutos, talvez a parada mais rápida. E o cansaço começa a se manifestar, principalmente depois que o sol se põe.

246 km depois estávamos chegando a Rosario, mas já com medo de pane seca, pois nesta autoestrada não havia posto de combustível. O Balcewicz já estava com a luz da reserva acesa. Por sorte, encontramos um posto entre as duas pistas da autoestrada, com um bom serviço de lanchonete. Já passava da meia-noite! Meia hora parado: abastecimento, banheiro, lanche e segue o rumo.

Duas horas mais tarde chegávamos ao hotel. Novamente, poderíamos ter escolhido melhor o hotel, e acho que é aqui que entra o planejamento. De qualquer forma, apesar de encontrar o hotel ter sido demorado, sair do hotel para seguir viagem foi até tranquilo.

Hotel simples, mas limpo, logo depois do banho, cama. E que sono gostoso! Ficamos no hotel Mayoral, com um posto de gasolina do lado. Aqui foi vantajoso. Um café bom, conversamos com um estudante brasileiro durante o café e logo nos preparamos para seguir estrada.  Até aqui já havíamos rodado 1.113 km, nada demais, mas o dia seria longo até chegar no Chuí, com duas aduanas pela frente.

Segundo dia: Argentina, Uruguai e Brasil

Na hora de abastecer a grande surpresa do dia: colocamos exatamente a mesma quantidade de combustível! Até os frentistas estranharam a coincidência. E estava uma moto de cada lado da bomba, ou seja, mesmo que quiséssemos fazer isto não seria possível.

Saímos às 8:18 hora local (9:18 hora do Brasil, sou seja tarde, para variar) e fomos até a ponte que cruza o paranazão. Se no Brasil o rio já é largo, na Argentina parece um mar. A beleza da região é impressionante e nos próximos quilômetros andaríamos numa espécie de delta do rio, por que era um alagado só. Até a cidade de Victória, é tudo parecido com um pantanal. Olhando o mapa até parece que região é uma gigantesca várzea do rio Paraná. A margem da rodovia, centenas de carcarás,  esperando algum atropelamento para matar a fome, uma vez que há muitas capivaras e pacas pela região. Seguimos até a cidade de Gualeguaychú, onde abastecemos com 253 km rodados. Aqui a parada foi de apenas 15 minutos, uma vez que estávamos perto da aduana com o Uruguai.

CC50 Pacífico Atlântico

Em algum lugar da Argentina

Seguimos em frente e cruzamos outra bela ponte sobre o rio Uruguai que separa a Argentina do Uruguai. Na aduna uruguaia, em Fray Bentos, foram apenas 13 minutos, super rápido e como sempre, os uruguaios muito gentis e prestativos. Dica, esta ponte tem pedágio e pode ser pago em pesos argentinos ou uruguaios. Não lembro o valor, mas é barato e o valor é arredondado de acordo com o câmbio das moedas locais.

CC50 Pacífico Atlântico

Entrando no Uruguai.

Agora nossa meta era encontrar um local para comer. E pasmem, domingo fecha tudo! Passamos por alguns comedores, ou estava fechado, ou estava lotado, sem previsão de atendimento, até que mais para a frente encontramos um bom local. No primeiro perdemos uns dez minutos e no Rancho El Reencuentro fizemos a festa, apesar de um pouco demorado. Aqui ficamos 1:25 minutos! Encontramos outros brasileiros chegando ao Uruguai, e acabamos conversando um bocado. Saímos do restaurante era passado das 16:10, horário local. Até o Chuí ainda tínhamos mais 490 km.

Apesar do Uruguai ser tudo de bom, este trecho que fizemos passava por pequenas cidades, a rodovia não era muito larga e a velocidade tinha de ser adequada ao local, o que nos atrasou um pouco. Próximo abastecimento foi com 250 km naquele posto ícone dos motociclistas: o posto Ancap no trevo para a cidade San José de Mayo. Aqui acabei deixando a moto cair. Saí dela e esqueci de abaixar o descanso lateral. Sorte que o parabrisa encostou em um carro, torceu um bocado, mas não quebrou ou riscou, nem a moto nem o carro. Saldo: orgulho ferido e demonstração do cansaço chegando a galope.

CC50 Pacífico Atlântico

O ícone dos postos

O próximo abastecimento teria de ser ali por perto de Maldonado, em Gregorio Aznarez, um povoado minúsculo onde perdi (ou esqueci) um dos meus cartões de crédito, bem o do Nubank. Por sorte não tive problemas para bloquear e solicitar outro, apesar de somente ter descoberto a perda do cartão alguns dias depois de terminada a viagem.

Essa parada foi programada por que no Uruguai os postos não tão frequentes nas estradas como no Brasil. E como eu já havia passado por esta região duas vezes, já conhecia a estrada. Abastecidos, o rumo agora era subir em direção Chuí, mais 248 km.

Tivemos muita sorte, pois o havia um grande movimento de carros voltando das praias e a pista nossa estava completamente livre. Passamos por esta parte com o sol já se pondo, no final do domingo. Mantivemos a velocidade de cruzeiro e logo passamos por Rocha e logo, logo, chegaríamos a aduana do Uruguai com o Brasil.

Como de hábito, a passagem pela aduna uruguaia é muito rápida, dez minutos. Carimbados os passaportes e dado baixa na entrada das motos, seguimos para o Brasil, chegando em solo brasileiro às 21:42. Fomos direto ao posto de gasolina, que fica na entrada da cidade, para registrarmos o último abastecimento, comer algo e procurar um brigadiano para assinar o formulário de testemunha.

CC50 Pacífico Atlântico

O último tíquete do CC50.

Como o Chuí é complicado com acomodações, já cheguei ali uma vez e não achei local para ficar, havíamos reservado um hotel em Pelotas, ou seja, deveríamos fazer mais alguns quilômetros para poder, finalmente descansar. Foram apenas mais 260 km, com chuva e atravessando o banhado do Taim. Ali a coisa ficou séria, primeiro a estrada que era só buracos, depois a chuva e para coroar a porcaria toda, o cansaço mortal. Nos trechos em que não passavam carros, e foram muitos, colocávamos as motos lado, isto é, uma na mão e a outra na contra-mão, para que ambas os faróis iluminassem bem a estrada, que é cheia de animais vivos e mortos! Foi muito tenso. Em alguns momentos o sono era tão forte que eu simplesmente apagava. Não adiantava abrir o capacete, cantar, ficar em pé, seja o que for. Quase saí da rodovia sem acostamento uma hora. Quando voltei da piscadela estava quase descendo o degrau da pista para o lado da pista. Assim, com o susto você acorda!

Enfim, muito cansados, sujos pela chuva que nos acompanhou por praticamente todo o banhado, chegamos ao hotel em Pelotas as duas da madrugada. Poderíamos ter prosseguido com o CC50 até Pelotas, teria dado tempo e ainda sobrava. Mas já havíamos encerrado o trecho em Chuí. Agora era tomar banho e dormir um bom sono, pois no dia seguinte eu queria dormir em casa.

E assim foi, 1.000 km depois eu estava chegando em casa, são e salvo e com estórias para contar. A volta para casa foi cansativa, longa, mas motivada pelo desejo de estar em casa. Viajar é bom, mas voltar para casa é ainda melhor.

CC50 Pacífico Atlântico

Total do passeio.

Um passeio destas proporções é bom de se fazer. Conheci muita gente, me diverti, fiz novas amizades, tudo de bom. O corpo dói, a bunda assa, mas passado um tempo somente ficam na memória as coisas boas e aquelas que acrescentaram algo a sua vida. Como é bom conhecer outros países, como é bom viajar pela América do Sul. Argentina foi a minha primeira vez, e também o Chile, e são países belíssimos, com uma geografia tão interessante como a nossa. A planícies sem-fim da Argentina, a beleza dos Andes argentino e chileno, tudo isto ficará na memória e na esperança de voltar algum outro dia. O Uruguai, então, terceira vez por lá e não será a última. El paísito, como chamam, é sensacional e aberto aos visitantes. Eles te recebem como amigos. Neste aspecto a Argentina e o Chile deixam a desejar. Movidos por uma desconfiança mútua, rescaldo de anos atribulados em um passado não tão distante, transformam a experiência da aduana em algo ruim, demorado e burocrata. Espero que melhore com o passar dos anos e com as adunas integradas.

Assim chego ao fim da narrativa que me levou a rodar 6.445 km em oito dias e feito um Iron Butt CC50 do Pacífico ao Atlântico. Até a próxima!

Atualização: o suporte em aço do parabrisa entortou e não houve meios de consertá-lo, resultado, comprei um novo!

 

Trajeto do CC50.
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